
[...] Os amigos apresentam-nos mundos novos. Ou uma outra maneira de ver o nosso. Foi mão amiga que me ofereceu a poesia. Um amigo apresentou-me a fotografia, e percebi-o melhor através da paixão de outro que há muito não vejo, mas que sei que quando o reencontrar provavelmente choraremos um abraço. Tenho aqui bem próximo um que me ensina bossa nova. Para Sul há uns que me mostram as alegrias de inventar famílias. Há um que vive numa pobreza toda especial algures por Lisboa. Podia seguir enumerando cada um dos interesses, dos apetites, das zonas da minha curta vida. Tive o imenso privilégio de ter crescido rodeada de amigos. Poucos, mas bons... Talvez por isso corra tantas vezes o risco de escolher trabalhar com amigos ou acabar amiga de com quem convivo. E também por isso me é particularmente doloroso perceber que um amigo, afinal, não o é.
Os amigos ganham-se ou perdem-se nas situações difíceis. No país da amizade não há tribunais, mas também não há mapas. A primeira coisa que um amigo faz é abrir a porta, a segunda é ouvir. As perguntas chegam depois, e serão todas passadas pelo crivo da sinceridade. O amigo está sempre lá e acolhe antes de opinar, cada um da sua maneira muito própria. O amigo fará tudo pelo amigo, mas não fará necessariamente aquilo que o amigo quer, mas o que a amizade lhe manda. A razão é simples: não podemos viver a vida através dos outros. Sem ter vivido alguma coisa nada tenho para trocar e é disso que se fala quando se fala de amizade: de partilha. Nenhum amigo evita problemas, ninguém tem as soluções que precisamos. Ajudam a perceber os problemas, o que é meio caminho para encontrar as soluções. Os amigos são-no independentemente do tempo e de outras coisas. Como não obedece a nenhuma regra, não é a distância nem a ausência de contacto que mata uma amizade. Claro que convém alimentar com desafios e questões, e o gozo comum de pequenos gestos ou prazeres, mas nenhuma amizade é igual, nem uma substitui outra. Há amizades para todos os dias, como algumas têm apenas a duração de um cometa. Há amizades que reanimam com um telefonema ao passo que outras só com décadas de trabalho. É a intensidade do que se viveu em comum que fixa cada um dos prazos e os modos de o gerir. Os modos de gerir a nossa entrega...
Também isso fascina na amizade: marca mais que uma tatuagem, voa mais alto que qualquer avião.
Sintam-se...
4 comentários:
Gostei muito. Principalmente do...
"O amigo fará tudo pelo amigo, mas não fará necessariamente aquilo que o amigo quer, mas o que a amizade lhe manda."
Gostei principalmente de estar presente... é que a amizade realmente não se mede nem em tempo, nem em tamanho, mas talvez em gestos, em pequenas coisas... Obrigado pelas "bofetadas" de vx em qdo!
Beijo
Ninguem vive sem amigos. E eu gosto muito de te ter como amiga. E agora vamos lá enfrentar outras ondas...:D...ah poizé...bebé...beijossssssss
"Agora eu era o rei
Era o bedel e era também juiz
E pela minha lei
A gente era obrigada a ser feliz"
Talvez venha a propósito, ou se calhar nem por isso, não sei. Mas ao ler o teu artigo lembrei-me imediatamente desta canção/poema de Chico Buarque. Enfim, há algumas palavras que nos transportam imediatamente para outras. Sente-te.
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